domingo, 6 de setembro de 2009

Minha vida e Isabela (Parte2)

“Fraco é o homem que não consegue domar seus próprios demônios.”


- O sol da manhã é mesmo lindo. - pensei.
Não devia ser mais do que oito horas. Vitória já não estava em casa. Aos sábados ela trabalha até tarde. Surpreendi-me de início, pois havia bastante tempo que eu não aproveitava uma folga dessa maneira, portanto a falta de costume era normal. Resolvi sair da cama, depois de muito enrolar. O dia parecia estar mesmo perfeito por ali. O sol brilhava forte e adentrava singelo o quarto pelas frestas da janela. A brisa que o acompanhava me afagava o rosto. Uma mistura de sensações que impossibilita qualquer mau humor matinal. Sentei à beira da cama e só daí lembrei-me de Isabela. Aquela menina estava em minha casa, provavelmente dormindo, afinal eram oito da manhã de sábado. É comum que os jovens durmam até mais tarde. Parei para pensar o quão rápido e desprovido de atenção, foi meu encontro com ela na noite anterior. Eu estava tão cansado, tão desligado, que mal pude dar o devido olhar para a situação. Mas agora eu teria tempo. Poderia conversar com ela e quem sabe colocar algum juízo naquela mente jovem e conturbada.
Envolvi-me num roupão e rumei em direção ao banheiro que se encontra ao fim do corredor.
Para chegar até ele, é preciso passar diante da porta de três quartos. Num deles dormia Isabela. Não fazia idéia de qual. Fui de repente tomado por uma curiosidade que não me era de costume. Queria verificar se a menina estava bem, se estava mesmo dormindo serena como eu imaginava. Abri com cuidado a primeira porta, mas me deparei apenas com uma cama muito bem arrumada e alguns lençóis embrulhados. Rumei em direção à segunda e eis que com toda a cautela toquei a maçaneta, girando-a para a direita. Abri. Lá estava ela. Adentrei apenas o olhar para que não fosse notado caso ela já estivesse acordada. Notei então que ainda dormia. Mas lhe confesso, caro leitor, que essa não foi a primeira coisa que notei.
Meus olhos se voltaram instantaneamente para uma análise detalhada de seu corpo. Ela não estava envolvida por lençóis. Encontrava-se deitada de lado. Trajava, naquele momento, nada além de um short curto e uma blusa fina. Pasmei com a silhueta de seu corpo. Era perfeita. Era delicada. Mostrava-se ali uma mulher.
E naquele momento,encostado ao ébano da porta, pude detalhar cada centímetro do corpo dela, que descansava sobre a cama numa paz incalculável.
Sua pele era clara, tanto quanto a de Vitória. Porém seus cabelos, diferentemente da irmã, eram negros. Negros como a noite. Desciam pelo seu corpo, como uma cascata. Eram lisos e finos. Eram lindos. Um contraste de beleza sem igual. Lembrei-me das obras pintadas que abarrotavam os corredores de nossa casa. Mas aquilo era real. E ao final dos segundos que me pareceram eternidade, pude notar a situação na qual me encontrava. Horrorizado com os pensamentos que me vieram à cabeça, fechei a porta desprovido da delicadeza inicial. Tomei de volta o rumo, entrei no banheiro e por lá fiquei. A porta, devidamente trancada. Um suspiro. A água no rosto costuma tranqüilizar.

-Vai passar. - disse a mim mesmo.

Minha vida e Isabela (Parte1)

Ao leitor, desejo de todo o coração que tente não se identificar com minha história. Se por algum motivo encontrar semelhança entre minha vida e a sua, procure de todo o modo não terminar como eu. Faça com que o trecho, humildemente narrado aqui, lhe sirva, ao menos, como um exemplo a não ser seguido.

Chamo-me Ezequiel. No momento tenho 32 anos. Sou casado com uma bela mulher chamada Vitória. Costumo brincar com minha esposa e lhe dizer que ela faz jus ao nome que lhe foi imposto. Trata-se de uma executiva, bem sucedida e de muitos talentos. Cursou uma das melhores faculdades, graças a seus dotes intelectuais. Domina três idiomas com fluência e é portadora de um dom para lidar com as pessoas, sem igual. Além de excelente profissional, Vitória é também uma excelente esposa, e amiga. Sua beleza é estonteante. Lindos cabelos loiros e olhos da cor do céu. 31 anos emoldurados num corpo de 25. Como pode ver, caro leitor, não tenho do que reclamar quanto à minha companheira. Porém é comum que nenhum de nós se sinta, em vida, plenamente satisfeito. É da natureza humana, desejar algo mais, ainda que não se saiba direito o que.

Moramos em um bairro na parte nobre da cidade. A casa foi, em grande parte, projetada por mim. A cozinha, os quartos, a sala, tudo tem um toque especial que faz com que o lugar tenha muito de mim e que possa agradar ao máximo minha esposa. Sou arquiteto, portanto projetos como esse são minha especialidade.
Não temos filhos. Não acreditamos que estejamos prontos para tamanha responsabilidade, mas não me nego a ter um, ou dois, algum dia. Nem Vitória. Só concordamos que não é a hora ainda. Afinal, tudo em nossa vida parece estar muito bem encaixado. Não há motivos para mudar a rotina. Temos uma vida confortável, com bons empregos, uma bela casa e nos damos muito bem, afetiva e sexualmente, devo acrescentar.

Nos últimos dias, tenho notado minha mulher um tanto eufórica, como se algo a incomodasse, como se estivesse me escondendo algum segredo. Estávamos casados a anos, eu sabia quando algo a afligia, mas achei melhor não dizer nada.
Mais alguns dias se passaram, sem maiores transtornos até que numa noite, ao chegar cansado do trabalho, me deparo com algumas malas próximas à porta. Desconfio. Enquanto retirava a gravata e o paletó, rumei em direção à cozinha, da qual pude ouvir algumas vozes, distinguindo apenas uma delas, a de minha esposa. A outra, tratava-se de uma voz também feminina, parecia jovem. Era quase inaudível. Um sussurro.

Ao atravessar a porta, deparei-me com Vitória sentada à mesa, ainda com roupas de trabalho. Encostada na pia, perto da bancada, havia uma jovem menina. Aparentava não ter mais do que 16 ou 17 anos. Algum tempo depois, descobri que sua idade era na verdade 15. Acabara de fazer 15 anos, para ser mais preciso. Tratava-se de Isabela, irmã de minha esposa, minha cunhada. Eu a havia visto em algumas reuniões de família. Confesso que não era muito fã desse tipo de evento e desejava me desvencilhar do compromisso, sempre que possível. Mas aquela menina, o que poderia estar fazendo em minha casa a horas tais? Teria acontecido alguma tragédia? Resolvi me sentar e deixar que minha esposa explicasse tudo. Quase uma hora de conversa. A menina manteve uma distância considerável de mim durante todo o papo. Pude entender ao final de tudo, que a pequena Isabela havia fugido de casa. Aprontou suas malas, pegou um ônibus e após um longo trajeto, chegara até nós.
Os pais de Vitória eram severos, ela mesma me contou histórias sobre sua infância na qual eles não permitiam que ela saísse de casa com os amigos, tampouco namorasse. Na verdade era uma prática comum no lugar onde foi criada. Uma cidade do interior com métodos conservadores. Mas ao que parecia, Isabela não tinha a mesma calma de Vitória. Era uma menina tinhosa e cheia de vontade de explorar o mundo, o desconhecido. Acima de tudo era corajosa. Sair do interior sozinha, com 15 anos e sem entender quase nada da vida aqui na cidade, não era coisa pra qualquer um. Essa petulância me cativou e me fez abençoar sua atitude, ainda que errada. Levantei da cadeira, aproximei-me da menina e lhe abracei com carinho. Prometi ali que tudo ficaria bem. E que eu estava disposto a permitir que ela ficasse na casa o quanto quisesse. Ela sorriu, um tanto desconcertada com meu abraço, mas meneou a cabeça como a quem agradece em silêncio.
Vitória prometeu ligar pros pais para explicar tudo, em seguida iria acomodar Isabela em um dos quartos de hóspedes. Tudo parecia estar sendo acertado. Decidi então não me envolver mais. Já era tarde. Despedi-me das duas e rumei em direção à cama. Estava exausto, havia sido um dia cheio e tudo o que eu queria naquele momento era dormir e aproveitar a longa noite de sono, afinal, o dia seguinte
era Sábado, bendito Sábado.